segunda-feira, 6 de julho de 2009

“O fazedor de utopias”

“Se Amílcar Cabral (Abel Djassi), ao lançar o mote para a sua geração - «africanização dos espíritos» - pretendia operar uma ruptura com a sua identidade de português negro, a minha saída do contexto da lusofonia fez-me perceber que Amílcar Cabral tinha de ser desportugalizado: Amílcar Cabral foi muito mais do que um lutador antifascista. O seu nacionalismo entronca-se nas chamadas questões da raça, cujos debates se iniciam no princípio do século por intelectuais negros do Estados Unidos e Caraíbas, como William Du Bois e Marcus Garvey, e ganha legitimidade no quadro das aspirações à independência dos países do terceiro mundo”.

“O General Spínola não era o único a acreditar que um esforço puramente militar era insuficiente para decidir a guerra. Amílcar Cabral concordaria com ele; afinal, a estratégia geral do PAIGC repousava sobre este princípio. A acção guerrilheira causava certamente danos irreparavéis nas forças portuguesas, garantia a defesa das populações e a prossecução de obras sociais, mas não era, de modo algum, determinante numa vitória final.”

“Che Guevara, no seu estilo popular, chamou-lhe «morde e foge» ...”
“... Em literatura mais séria sob a designação de «resistência estabilizada».”

“Em que se envolvem grandes estratos das populações”

“situação ... estava madura para, em muito pouco tempo, «graças ao avanço da guerra de movimento, começar, dadas as condições em que nos encontramos, a ofensiva geral para acabar com a dominação portuguesa no nosso solo».”

Extraído de “O fazedor de Utopias”, António Tomás, e publicado por Abenaa.*

O cinco de Julho de 1975 marca o reconhecimento por Portugal (e pelos portugueses) da independência e liberdade de Cabo Verde. Aproximadamente um ano antes, mais concretamente a 26 de Agosto de 1974, foi celebrada a assinatura do Acordo de Argel, no qual Lisboa reconhece a independência da Guiné-Bissau e reafirma o direito do povo das ilhas de Cabo Verde à autodeterminação e à independência.

Em simultanêo às independências de muitos outros países do continente africano. Cabo Verde logo a primeira demonstrou-se feliz, festejando com grande alegria nos arredores da localidade de Varzea para, subitamente, sentir-se ignorante do que fazer com a independência e a liberdade.

O primeiro pensamento, foi agradecer os portugueses pela independência e liberdade concedidas. Os portugueses, se tivessem agindo como alguns bons brasileiros teriam entregue ao africano à carta de alforria e recusariam o beijo nas costas da mão de agradecimento pela carta. Teriam recusado os presentes de agradecimentos. Entretanto, o que fizeram? Aceitaram os presentes e transformaram-nos em instrumentos de perpetuação do colonialismo, nesta fase denominado por Kwame Nkrumah “Neocolonialismo” (ler “O Neocolonialismo” deste líder ganês).
Neste cinco de Julho seria bom fazer-mos um relatório de balanço das transformações, mudanças acontecidas em Cabo Verde, de 1975 a 2009.

De seguida à independência, Cabo Verde introduz a Democracia e institui-se Estado de Direito Democrático, apologista da cidadania e dos Direitos Humanos. Insere-se, desta vez voluntariamente, no tráfico do triângulo dos continentes, incorporando, realmente, a condição de excelente posição geo-estratégico. Desenvolve o turismo e com isso, principalmente, o comércio de produtos locais, artesanais, desde a música ao todo o país.

Em 2009, Cabo Verde encontra-se, ainda, na base do após-independência, ainda a objectivar a estruturação de necessidades básicas como a água, a electricidade, as estradas, a agricultura e a pecuária, os portos. Por isso também, a nosso ver, ainda é possível dar um novo rumo à Cabo Verde para, assim, realizar os intentos de independência e liberdade de Amílcar cabral, Kwame Krumah (prosperidade), Marcus Garvey, Jomo Keniata, Nelson Madela, Zumbi, Nzinga, Gandhi ...

Amílcar cabral sempre “participou de actividades da Juventude relacionadas com a tomada de consciência da situação colonial do povo de Cabo Verde”. Mas após o seu falecimento a única coisa que até agora alcançou, por nosso contributo, é uma independência quase política. Quase, porque não a temos integralmente. Sim, porque para se falar em independência política teríamos que ter a independência econômica e a nossa economia depende majoritariamente de investimentos externos e estrangeiros e “doacções (?)”. Sem independência económica não se pode falar de independência política pois não se estará vinculada a imparcialidade, objectividade e subsequentemente a soberania.

A situação é muito sensível, pois Cabo Verde está no limiar entre necessitar das ajudas externas e desenvolvimento e de efectivamente alcançar a liberdade. No nosso entendimento É TEMPO DE REVOLUÇÃO CULTURAL (como bem disse Amílcar Cabral na liderança do PAIGC). De todos os jovens arragaçarem-se, confiantes que é preciso, ainda, continuar a Luta. E fazer mais utopias.

Abenaa

*
“A minha poesia sou eu”
*
“No fundo de mim mesmo”

No fundo de mim mesmo
eu sinto qualquer coisa que fere minha carne,
que me dilacera e tortura ...

...qualquer coisa estranha (talvez seja ilusão),
Qualquer coisa estranha que eu tenho não sei onde,
Que faz sangrar meu corpo,
Que faz sangrar também
A Humanidade inteira!

Sangue.

Sangue escaldante pingando gota a gota
no íntimo de mim mesmo,
na taça inesgotável das minhas esperanças!
luta tremenda, esta luta do Homem:
e beberei de novo – sempre, sempre, sempre –
este sangue não sangue, que escorre do meu corpo,
este sangue invisível – que é talvez a Vida!


Amílcar Cabral

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