sábado, 25 de abril de 2009

Zimbabueanos: preocupados que a ajuda tenha condições

Harare - A ajuda com condições frequentemente não se traduz em melhoria das vidas das populações para quem esse dinheiro foi ostensivamente obtido em primeiro lugar. A maior parte do capital recebido sob a forma de ajuda é utilizado para pagar as dívidas pendentes aos doadores ocidentais.Estas foram as opiniões dos participantes numa conferência da Coligação sobre Dívida e Desenvolvimento do Zimbabué (ZIMCODD) que teve lugar na semana passada em Harare. A ZIMCODD é uma organização da sociedade civil que trabalha em prol da justiça social e económica.A conferência foi convocada para discutir de que forma se pode estimular a economia zimbueana quando houver um acordo político da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) para aquele país.Já existem rumores de uma superabundância de doadores prontos a oferecer ajuda ao novo governo de unidade nacional do Zimbabué. Mas o país ainda se debate com reembolsos de dívida que remontam a 1980, quando obteve independência da Grã-Bretenha.Alguma desta ajuda foi recebida durante a década de 90 através do desastroso Programa de Ajustamento Estrutural Económico (ESAP) e teve como resultado a crescente dívida externa do Zimbabué, que alegadamente ascende a 4.9 mil milhões de dólares, de acordo com estatísticas da organização sueca de solidariedade Grupos da Suécia em África (AGS).Apresentando uma comunicação intitulada ‘‘Panoramas para a Ajuda, Perspectivas para o Zimbabué’’, Vitalice Meja do Fórum e Rede Africanos sobre Dívida e Desenvolvimento (AFRODAD) defendeu que, devido às condições que acompanham o dinheiro da ajuda, os governos africanos acabam por utilizar apenas um quarto do dinheiro recebido ao passo que pagam quatro vezes mais do que aquilo que foi recebido.O AFRODAD é uma organização da sociedade civil preocupada com o fardo da dívida africana.‘‘A ajuda continua a ser condicional e, em resultado, os governos africanos acabam por receber apenas cerca de 37 por cento do montante original, portanto qual é a vantagem?’’ perguntou Meja.Referiu que a sociedade civil tem um papel importante a desempenhar nas futuras relações dos doadores com qualquer novo governo do Zimbabué. ‘‘Precisamos de desmistificar a visão da ajuda como caridade. Não o é, mas continua a ter um papel a desempenhar neste país. Por exemplo, são necessários mais de 11.7 mil milhões de dólares para reabilitar as estradas e garantir o fornecimento adequado de água – que são alguns dos componentes principais de uma recuperação.‘‘Mas de onde é que virá todo esse dinheiro?”Meja exigiu que se repensasse este assunto: ‘‘Chegou a altura de dizermos párem de nos dar a vossa ajuda, já não a queremos. Os países africanos são exportadores líquidos de capital. Estes doadores devem ser vistos como aquilo que são – criminosos. Porque 95 por cento do capital africano vão para o Ocidente a título de pagamento de dívidas.’’Sublinhou que, se os governos africanos vierem a recusar ajuda, antes disso devem criar-se políticas económicas sólidas. Disse ainda que outros Estados no Sul, como o Chile e a Argentina, confrontaram este sistema injusto mas certificaram-se que tinham o enquadramento para as políticas macroeconómicas no seu devido lugar.Acrescentou que, em vez de tentar atrair investimento directo estrangeiro dos países ocidentais, os países africanos deviam atrair investidores africanos da Diáspora.Dennis Kellecioglu, economista junto da organização Grupos da Suécia em África (AGS), tem uma opinião diferente da de Meja, dizendo que os países africanos como o Zimbabué não se podem dar ao luxo de repudiar a ajuda estrangeira, porque nem toda a ajuda é má.‘‘Como Africanos, temos de perguntar se temos meios para fazer isso se ainda tivermos uma ajuda boa. Por exemplo, esta reunião foi paga com dinheiro proveniente de ajuda. Estamos a almoçar bem, o local da reunião está pago e estamos a desenvolver capacidades com dinheiro proveniente de ajuda. Não se trata de boa ajuda?’’A ajuda para África é frequentemente um ponto de debate. Muitos pensam que é desperdiçada por governos corruptos ou gasta em projectos que fracassam. É inegável que, ao longo dos anos, muita ajuda estrangeira não foi usada tão eficazmente como poderia ter sido. Mas a ajuda pode fazer uma grande diferença nas vidas de mulheres e homens que vivem na pobreza.Moçambique foi em dada altura o país mais pobre do mundo, mas tem progredido na senda do crescimento sustentável, graças à ajuda.Ao longo dos anos, a ajuda tem sido usada como peão politico no xadrez da Guerra Fria e também para promover modelos económicos específicos. Através daquilo que é habitualmente conhecido como o ‘‘Consenso de Washington’’, doadores, Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional impuseram cortes na despesa pública.Ao mesmo tempo, encorajaram os governos a liberalizer o comércio e a reduzir o papel do Estado nos assuntos económicos, principalmente através da privatização de empresas públicas.O resultado foi a privatização de sectores vitais dos países africanos, o que deixou muitos países em desenvolvimento em dificuldades para conseguirem enfrentar a actual crise mundial financeira e alimentar. É provável que esses mesmos doadores abandonem estes países à medida que tentam resolver a crise financeira mundial.Segundo o Instituto de Pesquisa para o Desenvolvimento Laboral e Económico do Zimbabué (LEDRIZ), existem crescentes provas que as soluções que acompanham o dinheiro proveniente da ajuda raramente funcionam no interesse dos pobres. Nos últimos cinco anos, tem havido um crescente consenso internacional que as condicionantes das políticas económicas não funcionam.O LEDRIZ é um grupo de reflexão sobre políticas e investigação do Congresso dos Sindicatos do Zimbabué a (ZCTU).A Declaração de Paris sobre a Eficácia da Ajuda, assinada há alguns anos por doadores e beneficiários da ajuda, definiu 12 objectivos que deveriam ser alcançados até 2010. No seu centro encontra-se a necessidade de proporcionar mais ajuda a longo prazo através de sistemas governamentais beneficiários em conformidade com as prioridades de desenvolvimento desses governos.Mas Meja continua a insistir que ‘‘idealmente, os países africanos devem deixar de receber ajuda e de se comportarem como miúdos de 20 anos que ainda estão a ser desmamados. Devemos exigir reparações por aquilo que estes países doadores nos fizeram, mas isso deve ser feito colectivamente.’

Stanley Kwenda
www.mwglobal.org/ipsbrasil.net/nota.php?idnews=4328

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