segunda-feira, 1 de novembro de 2010
O Drama de Sudão
Há quem ache o movimento das nuvens apenas um processo normal (natural) da ordem universal, sem perceber os seus maravilhosos fluxos e significados. Quem ache, com base no tamanho do próprio cerébro, que é superior, melhor que o outro, suficientemente para subjugá-lo, desculturá-lo depois aculturá-lo, e tentar exterminá-lo. Há quem ache que não houve genocídio em Sudão, que tudo não passa de mero sensacionalismo jornalístico.
Genocídio, depois de 1944, vem sendo definido como a destruição deliberada e metódica de pessoas determinada por diferenças raciais, religiosas, políticas. O professor Molefi Kete Asante defende que “não pode haver desculpa para a escravidão e o genocídio”, sendo ambos “moralmente indefensáveis, brutalmente monstruosos e eticamente repugnantes” (in “Genocide in Sudan”). Em 1991, quando escreveu este artigo, Asante considerou que em Sudão o nacionalismo reivindica uma base biológica para a perseguição, opressão, exploração e escravização de outros, sucedendo a escravização de africanos pelos próprios africanos.
Em sudão unifica-se o famoso Rio Nilo, até o Egipto, vivendo a maioria da população, sobretudo os Shilluk nas suas margens, praticando o cultivo da terra e a agricultura, já que o resto do país é demasiado seca.
Os primeiros povos (Dinka, Jhaynah e outros dentre 500), que habitaram esta parte do continente africano/Alkebulan, eram principalmente constituídos de pastores nómadas que andam com os rebanhos em busca de novos pastos (o que igualmente revela o nível elevado de consciência), mas a “guerra santa” destruiu também as pastagens e rotas de pastoreio.
Desde a antiguidade o Sudão (palavra árabe usada primeiramente pelos geógrafos muçulmanos ao descreverem “a terra dos negros”) foi uma terra de confluência racial, sobretudo depois da queda de Núbia e da chegada dos árabes. Foi a primeira região que os árabes entraram em contacto e onde é grande a influência islâmica. A área divide-se em 3 partes: o Sudão ocidental (interior do Senegal e os rios do Alto Níger); o Sudão central (a leste do último); e o Sudão egípcio (do sul do Egipto). O Sudão egípcio foi conquistado pelo Egipto no século XIX, antes de ser novamente separada e reconquistada como “Sudão anglo-egípcio”. Hoje é o maior estado africano, a república do Sudão.
A fronteira actual entre o Egipto e o Sudão não existia. O Egipto do Sul e a parte norte do Sudão eram conhecidos em conjunto como a Núbia. Subsiste, no entanto, um grande contraste entre o norte e o resto do país. O norte é maioritariamente muçulmano, de língua árabe, o Centro e o Sul expressa línguas e crenças africanas. Os africanos residentes no norte foram convertidos ao islamismo e relacionam-se com o Egipto e o mundo árabe e o restante é na maior parte animista e liga-se ao mundo africano (diferem em relação à língua, formação, cultura e religião). Conflitos entre os dois grupos, assim como sucedeu em Ruanda, resultaram mais de duas décadas de guerra civil.
Desde a independência do país, em 1956, o governo sudanês impõe o islamismo à população. O prof. Molefi diz que “inerente à configuração política da nação foram as sementes da sua própria destruição: o fundamentalismo religioso islâmico e animosidade étnica” fecundadas “por uma da mais severa crise de identidade em toda a África” resultando mortes incomensuráveis, órfãos, refugiados, pobreza. A população residente no Sul do país, de culto e expressão africanos, foram forçados a dirigir-se para Kartum, a capital de Sudão, vivendo agora em bairros de lata nos seus arredores. O prof. Molefi também estima que “o Sudão é um país em crise permanente, pois é uma nação de pessoas totalmente deslocadas de um senso de realismo histórico”.
Assim, o século XIX no Sudão foi de jihads, guerras santas destinadas à propagação do islã e à criação de estados islâmicos. A partir do século XI predomina a vontade de impor o islã por todos os meios e a todos os níveis da vida social. O islã manteve, até o século XI relações de coexistência com as religiões locais africanas largamente dominantes no duplo plano de número dos adeptos e dos efeitos sociais e políticos. Igualmente, no século XI, as relações do islã com as religiões antigas, sobretudo as práticas e costumes locais mudaram quando a aceitação do compromisso e da coexistência cedeu lugar à vontade de impor o islã.
Houve por todo o lado uma vontade de uniformização dos modos de vida, de maneira a torná-los estritamente conformes com os preceitos, a lei e o direito do islã: adopção quase generalizada de nomes muçulmanos, transformação das regras de filiação e de herança, com a desaparição progressiva das regras matrilineares em proveito dos mecanismos da patrilinearidade; homogeneização dos gostos e dos hábitos alimentares na sequência da condenação de certas práticas e da promoção de outros comportamentos, importados ou adaptados de Magreb; mimetismo vestimentar; codificação estrita da condição e dos géneros de vida das mulheres, necessidade para as elites, no caso de quererem ser levadas a sério pelos seus interlocutores árabes, de mostrar que estavam perfeitamente informadas a respeito das teorias e dos debates do momento. O direito muçulmano era solicitado não só para justificar a exclusão dos ditos infiéis da posse da terra, mas também para regularizar os antagonismos crescentes entre os próprios muçulmanos.
Africanos islamizados, roubados da sua tradição africana, afligiram o povo africano, afugentando-o do próprio terreno e comunidade/família, legando-o campos de refugiados, sem nenhuma condição de sobrevivência. Hoje, Inúmeras crianças formam os órfãos do drama em Darfur, as mulheres vítimas de agressões sexuais e os homens estão quase todos mortos ou mutilados.
Entretanto, seguidamente à fragmentação do continente africano, às invasões (motivadas, sobretudo pelo ouro sudanês (petróleo), às longas lutas e conquistas libertadores, ainda, resta aos Alkebulanos o papel de resgatar a tradição africana ancestral, sua identidade, e salvaguardar, para a posteridade, a sua sagrada cultura. O professor Asante, no artigo “The Future of African Gods. The Clash of Civilizations” pede-nos para observar o seguinte: “Show me the gods we africans workship and i will show the extent of our moral and ethical decay”. Concluindo que os africanos esqueceram a sua tradição/memória e aceitaram os deuses daqueles que os escravizaram e colonizaram, por isso actualmente se encontra num estado de Maafa.
Veja o filme “Areias e Lágrimas”.
Abenaa.
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